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Volatilidade do voto é esperança de Freixo para tentar virada no Rio

Crivella segue favorito, mas a diferença para nome do PSOL caiu nove pontos, diz Ibope Eleição na cidade pode voltar a ter número recorde de votos brancos, nulos e abstenções

Marcelo Freixo, candidato do PSOL, nesta quinta-feira.
Marcelo Freixo, candidato do PSOL, nesta quinta-feira.Midia Ninja (EFE)
Felipe Betim

"Não faço ideia em quem vou votar. Vou decidir na hora, quando estiver na urna", lança Messias Martins, um comerciante de 48 anos de Madureira, tradicional bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro. Ao seu lado, Bruno Marques, 26 anos, oscila. Antes decidido a não dar nem a Marcelo Freixo (PSOL) nem a Marcelo Crivella (PRB) o endosso para que sejam novo prefeito do cidade, agora ele cogita escolher, na votação do próximo domingo, o senador e bispo licenciado. "Crivella me parece o mais centrado. Já é conhecido há muito tempo", diz Marques. Na outra ponta da cidade, em Santa Cruz, Ivy Amanda diz que já mudou de voto várias vezes. "Agora estou pensando em votar nulo. Crivella vai dar dinheiro para a igreja. Se escolher algum, acho que vou de Freixo. Ele tem boas propostas, mas apoia black bloc, né?"

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Os depoimentos acima fazem parte de uma série colhida pela reportagem nos últimos dias durante giro pela periferia carioca. Ajudam a desenhar um cenário ainda com alta volatilidade do voto que se transformou na esperança de Freixo para a difícil tarefa de conseguir uma virada na reta final. A candidatura do PSOL recebeu um alento na semana que passou com o resultados da pesquisa do Ibope de quinta-feira (20): Crivella caiu de 51% para 46% das intenções de voto; já o deputado estadual Freixo subiu de 25% para 29%. A distância ainda é bastante grande, 17 pontos nos votos totais e 22 considerados apenas os válidos, mas caiu nove pontos, num momento que se intensifica a campanha para "desconstruir" Crivella. Além da propaganda psolista na TV, a candidatura do senador ligado à Igreja Universal e a TV Record também tem enfrentado uma onda de reportagens negativas na imprensa.

"Tudo conta, inclusive o último debate da semana que vem. As pessoas estão tomando decisões cada vez mais tarde. Sobretudo nesta era de comunicação via WhatsApp e redes sociais", diz Márcia Cavallari, presidenta do Ibope. Apesar da boa vantagem de Crivella, o cenário instável faz com que tanto Cavallari como Mauro Paulino, diretor do Datafolha, evitem cravar resultados e tendências. Segundo Cavallari, 13% dos eleitores ainda podem mudar seu voto, segundo a última pesquisa. Trata-se de um número similar ao da última pesquisa Datafolha, divulgada no último dia 17. O estudo do Datafolha detalha ainda que a taxa de eleitores totalmente decididos por Crivella é de 88% e por Freixo, de 86%. "Não tem como prever. Já vi eleições virarem de sexta até domingo. A pesquisa não tem o papel de antecipar o resultado", reforça a presidenta do Ibope.

Já Paulino, do Datafolha, lembra que "os cariocas costumam buscar novidades". Crivella ainda é "o franco favorito, mas não dá para cravar", segundo argumenta. Para ele, as eleições municipais de 2016 vêm sendo muito atípicas e imprevisíveis. "Foi a eleição do voto útil, do eleitor conectado, da antipolítica... E isso continua agora no segundo turno. Em geral, as tendências que se captam na semana anterior não se revertem. Então o mais provável é que Freixo continue subindo e haja uma aproximação ainda maior".

Campanha negativa

O segundo turno das eleições no Rio começou com uma disparada de Crivella na frente e uma virulenta campanha contra Freixo nas redes sociais promovida por apoiadores do senador — como a família Bolsonaro, de extrema direita, e o pastor Silas Malafaia. O candidato do PSOL já havia decidido partir para o ataque na TV, mas o principal golpe de imagem para seu adversário viria, na última semana, de uma reportagem que ganhou a manchete do jornal O Globo, o principal da cidade. O texto explorava um livro no qual Crivella atacava outras religiões e os homossexuais. Outras publicações surgiram ao longo dos dias seguintes, abalando a imagem de evangélico moderado que o senador vem tentando consolidar e dando mais munição para a campanha do PSOL em seus programas de televisão e no debate realizado pela Rede TV na última semana. A edição deste fim de semana da revista Veja também vai para a conta dos reveses do bispo licenciado. A capa traz um jovem Crivella preso e fichado pela polícia em 1990, ao tentar retomar um terreno invadido onde a Igreja Universal pretendia erguer o templo. É improvável que as notícias abalem o eleitorado mais consolidado de Crivella, mas só a próxima rodada de pesquisas vai responder se houve estragos entre seus eleitores fora do universo evangélico, fatia crucial para manter sua vantagem.

Seja como for, o nome do PRB e principalmente o do PSOL, que precisa desesperadamente crescer, terão de lidar com um problema comum: o desencanto do eleitorado com a política e a rejeição aos candidatos, localizados em extremos opostos do espectro ideológico. No passeio do EL PAÍS em Madureira, Zona Norte, e Santa Cruz, no extremo oeste da cidade, essa foi a tônica dos entrevistados e a maioria prometeu votar branco ou nulo. Segundo o Ibope, 21% do eleitorado pretende fazer essa opção no próximo domingo, uma taxa altíssima para um final de campanha já que "o segundo turno se caracteriza por ser um período de menos indecisão que no primeiro", explica Paulino. Caso o número se confirme, superará o recorde do primeiro turno (18%).

Os amigos Rafael, 24, e Alif, 22, estão neste grupo de decididos a anular o voto. "Um deles quer tudo para a Igreja. O outro defende ladrão e estuprador, mas não defende trabalhador", explica Rafael, que trabalha com seu colega no Mercadão de Madureira. Este acrescenta: "Não vai mudar nada. Ele aparecem aqui em época de eleição e depois nunca mais".

A rejeição do eleitorado carioca à política vem se potencializando, segundo Paulino, devido à uma polarização extrema: há dois candidatos que representam dois espectros políticos muito claramente. Cavallari, do Ibope, explica: "A questão comportamental, de valores, é fundamental. Não é esquerda versus direita, é conservador versus liberal. Os que tem ensino superior tendem a votar no Freixo, e os com menos escolaridade tendem a votar no Crivella". Se em São Paulo o discurso da gestão e do "novo" decidiu a eleição para João Doria Jr., no Rio nenhum candidato parece ter conseguido captar a rejeição política tradicional. Mesmo entre muitos que escolheram um dos candidatos, a lógica é de votar no "menos pior".

"Estou escolhendo entre a merda e o cocô. Não voto no Freixo porque ele vai contra tudo o que eu aprendi de pequeno", argumenta Levi da Luz, de 32 anos, que decidiu votar em Crivella. "Ainda que não possa fazer essas coisas como prefeito, Freixo defende a legalização da maconha, a desmilitarização da PM e a legalização do aborto", diz esse técnico de equipamento médico de Madureira. Suas razões são as mesmas para que Raí dos Santos, de 21 anos, tenha escolhido o candidato do PRB: "Meu voto é contra o Freixo. Sou cristão e suas posições com relação ao abordo e drogas vão contra minha fé", argumenta o rapaz, que votou no ultraconservador Flávio Bolsonaro no primeiro turno. Enquanto isso, Núbia Coelho, de 31 anos, decidiu apostar em Freixo para "tentar alguma coisa diferente", segundo diz. "Crivella já esteve com Dilma e agora está com Garotinho, que roubou para caramba. O Freixo ao menos enfrentou as milícias".

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